História da Festa


A festa de Iemanjá, como tantas outras efemérides religiosas, é um exemplo 
particularmente significativo da resistência e afirmação da nossa condição humana, que não 
desdenha da razão, mas também que não pode ser compreendida sem o concurso da fé, da 
religião, da adoração ao sagrado, pelos rituais esotéricos e exotéricos; pelos anúncios 
misteriosos da mediunidade, pelos êxtases dionisíacos, pelas apostas nos mistérios da vida e da existência consubstanciadas nos mais secretos sentimentos  e nos mais  fervorosos afetos 
demonstrados pelas manifestações públicas dos seus devotos. 
A festa em homenagem a Iemanjá, cuja história é contada brevemente neste artigo
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não se restringe ao festejo que, por si só, tem um encontro marcado com o resgate da 
divindade  e suas afecções, que o Iluminismo pretendeu eliminar. A par de uma narração 
histórica do sentido e significado da estátua de Iemanjá, da importância da procissão dos fiéis 
umbandistas e seus simpatizantes, os autores deste artigo pretendem conferir uma dimensão 
ecossistêmica da realização do festejo, entendendo que há razões suficientes para perceber 
que, nessa efeméride anual em homenagem à  Rainha do  Mar, existe uma educabilidade 
ambiental certamente presente em toda a ritualística dos umbandistas. 
A importância de se perceber uma educabilidade ambiental nas efemérides em 
homenagem a Iemanjá repousa no fato de conferirmos ao episódio anual uma dimensão 
sincronizada entre o espírito e a matéria, ou seja, o espaço entre, que simboliza o aprendizado 
e a educação das virtudes próprias da razão e do sentimento de fé, de religião; de proximidade 
e, ao mesmo tempo distância, do divino, cujos territórios geográficos reservados ao sagrado e 
ao profano repousam sob o primado da significação cultural do próprio conceito de natureza 
da qual somos parte integrante. 
Finalmente,  a primeira parte deste Artigo tem  por título “A primeira festa de 
Iemanjá”; a segunda parte apresenta a oficialização da festa e tem por título “A oficialização 

da festa de Iemanjá”; a terceira parte, diz respeito à história da estátua de Iemanjá e tem por 
título “A escultura de Iemanjá na praia do Cassino como o maior símbolo da fé umbandista”. 
O último capítulo tem por objetivo dimensionar as contribuições da efeméride em sua relação 
com a Educação Ambiental e tem por título “O sagrado, o profano e a educabilidade 
ambiental”. 



A primeira festa de Iemanjá


Consta que, na data de 1º de fevereiro de 1963, o então vereador de Rio Grande, João

Paulo Araújo, organizou a primeira festa dedicada a Iemanjá, na praia do bairro Cassino, em 
Rio Grande – RS. Consta, também, que todas as despesas da festa foram pagas pelo referido 
edil, incluindo a compra de um motor a óleo diesel e postes para a iluminação da praia, 
enquanto a responsabilidade de contratação de pessoal para a colocação dos postes, a 
construção de um palanque e a logística de alimentação contou com a ajuda de Nilza Araújo, 
esposa desse vereador.
O vereador João Paulo Araújo, eleito pelo então Movimento Democrático Brasileiro 
(MDB) foi também o fundador da primeira liga espírita de Rio Grande, ainda no ano de 1963, 
a qual passou a ser denominada Liga Espírita de Umbanda Rio Grandina Mãe Iemanjá, na 
época situada na Av. Silva Paes, número 350.
É importante lembrar que o município do Rio Grande teve o seu primeiro centro de 
umbanda criado no ano de 1926, por Otacílio Charão, então oficial da marinha mercante e 
oriundo do Rio de Janeiro. Já na década de 1940, a cidade do Rio Grande teve um expressivo 
aumento do número de centros de umbanda como, de resto, no Brasil. Entrementes, a 
fundação do Centro Espírita de Umbanda Cruzeiro do Sul (C.E.U.C.S.) foi fundado em 17 de 
agosto de 1946 e situava-se na antiga Vileta, no número 337, atualmente Rua Napoleão 
Laureano, exatamente na residência do senhor Francisco Pagano Filho, conforme consta nos 
registros da Ata nº  01, do C.E.U.C.S.
Em entrevista concedida pela senhora Nilza Araujo, no início do ano 2001,  [ela 
mesma] destaca a sua percepção da umbanda dos idos da funcação do C.E.U.C.S. Para a 
esposa de João Paulo Araújo,



Não há dúvida de que o relato da senhora Nilza Araújo revela uma ácida crítica 
endereçada aos festejos de Iemanjá. Ou melhor: revela uma advertência quanto à 
ameaçadora promiscuidade do espaço do sagrado afiançado pelo considerável aumento 
de curiosos, bem como pelo comércio paralelo e à participação de religiões de matriz 
africana. É que as oferendas  a Iemanjá, já no ano de 1966, não se restrigiam mais à 
praia do Cassino, mas também à costa do canal, proximidades do Matadouro e do Saco 
da Mangueira. Ou seja, se em 1963 a festa em homenagem a Iemanjá tinha um caráter 
particularmente restrito, em 1966 expandia-se sobremaneira. Ora, essa expansão 
expressa pelo caráter do número de devotos e registrada pelo Jornal Rio Grande não se 
resumia aos festejos de Iemanjá. Em realidade, era a expansão mesma do espaço do 
sagrado (enquanto  locus urbano restrito aos Centros onde se realizavam os cultos a 
Iemanjá) ampliando suas  fronteiras rumo à praia do Cassino e ao longo da costa do 
Canal..
Entrementes, é nesse ir-e-vir que a experiência do espaço, percebido como 
profanado, que o culto  a Iemanjá alarga-se e passa a se redefinir  – seja através das 
oferendas, da realização de cultos e da procissão  – como derradeiro encontro dos 
devotos de Iemanjá com a natureza, ou melhor, o reencontro do humano com a sua 
origem inelutável com a natureza, sintonizando-se com os valores próprios à noção de 
educabilidade ambiental, uma vez que todo o mistério da transumância entre cultura e 
natureza tem um encontro marcado com as relações tanto místicas quanto geofísicas 
para a expressão do divino. 
Do espaço natural, enquanto espaço da natureza emerge também o espaço do 
cultural, através da instauração de sentidos e significados místicos, agora não mais 
restritos ao centro da cidade. Em outras palavras, a expansão dos cultos umbandistas,
até então restritos ao espaço urbano (onde o território do sagrado represava-se 
fundamentalmente no altar dos orixás e divindades, o congá) realiza-se agora no próprio 
espaço até então considerado profano, onde os umbandistas têm um encontro 
privilegiado com os diferentes elementos da natureza e reapropria-se do êxtase vicário 
com a natureza consubstanciada em seus oráculos, antes confinados à ideologia 
branqueadora,  e reeduca-se ambientalmente a partir da polifonia harmônica entre o 
sagrado e o profano. 



A oficialização da festa de Iemanjá
No dia 2 de fevereiro de 1968, o Jornal Rio Grande noticia a proposta do então 
vereador David Manoel Gautério para que a festa de Iemanjá seja compreendida como 
um misto de folclore e religião. Esse edil defende a oficialização da festa em 
homenagem a Iemanjá, argumentando a existência de 2.100 terreiros  em Rio Grande, 
ressaltando que a festa de Iemanjá é a maior de todas as festas do Estado. Além disso, 
ainda segundo o Jornal Rio Grande daquele mês e ano, Manoel Guatério requisita ao 
subprefeito do Cassino,  Sr.  Edilson Miller Barlém, que a praia seja totalmente 
iluminada no local específico da realização dos festejos umbandistas, conforme petição 
abaixo:
Considerando-se a festa mais concorrida do  Estado como peregrinação de 
todos os recantos do interior no afã de homenagear a referida Mãe, venho, 
através do presente, solicitar seja oficializado, pelo Executivo Rio-Grandino, 
o referido pedido para a Festa de Iemanjá, cuja peregrinação supera (...) todas 
as festas religiosas do Estado. (Jornal Rio Grande, 1968)
A festa de Iemanjá é o movimento em que o sagrado se projeta fora do 
santuário realizando sua epifania triunfal, assevera Carlos Alberto Steil (1996, p.43). 
A  Prefeitura do Rio Grande reconheceu a festividade em homenagem a 
Iemanjá, por perceber nela também um incremento turístico considerável. Com efeito, o 
policiamento na praia do Cassino foi reforçado e a frota de ônibus foi aumentada. O 
Departamento Estadual de Estrada de Rodagem  (DAER), preocupado com o grande 
volume do trânsito em decorrência da festividade, recapeou o asfalto  da estrada  que 
então se encontrava danificado. Tanto o ambiente físico como o social sofria sensíveis 
transformações em vista da festa de Iemanjá. Evidentemente, essa preocupação do 
poder público para com uma ambientação condizente com a festividade, foi reforçada 
pelo inegável aumento da movimentação local ocasionada pelas excursões procedentes 
de vários municípios, como Pelotas, Cruz Alta, Bagé, Pedro Osório, Santa Maria e 
Porto Alegre.
É interessante lembrar que a  Prefeitura de Rio Grande, estimulada pelo 
incremento inaudito de movimentação dos acólitos umbandistas, passou a participar, 
juntamente com a Liga Espírita de Umbanda, na organização do evento, apoiando tanto 
na logística quanto, até mesmo, na construção do palanque. Assim é que, em fevereiro 
de 1968, o Jornal Rio Grande destaca:
Vindo de várias partes do Estado, os umbandistas, com suas vestes brancas, 
vieram abrir-se à solenidade, num palanque armado pela  Prefeitura e 
fartamente iluminado, distribuindo-se depois ao longo da praia que, em 

extensão é a maior do mundo, oferecendo condições excepcionais para a 
concentração de âmbito estadual.
Por outro lado, o início da década de 1970 foi marcado pelo aumento do 
número de terreiros oriundos de outras partes do  Estado a fim de participarem das 
homenagens  a Iemanjá. Contudo, se, por um lado, há, efetivamente, um incremento 
significativo de ganhos alcançados pela umbanda no sentido de sublinhar a sua 
legitimidade, dado o contingente de devotos, por outro lado constata-se o que, segundo 
Charles S. Barros denunciou como “estigma social”, o fato de que os participantes da 
umbanda não confessem a sua fé, ou seja: 
Após 1970 percebem-se os ganhos alcançados pela Umbanda no que 
diz respeito à sua legitimidade, mas o estigma social que ainda cerca 
sua prática faz com que muitos de seus adeptos não confessem sua fé. 
(BARROS, 1999, p. 164)
À medida que aumenta o número de adeptos, terreiros e simpatizantes junto à 
praia do Cassino para os festejos a Iemanjá, aumenta proporcionalmente a ampliação do 
espaço do sagrado, antes restrito ao terreiro no centro da cidade, como já salientamos 
anteriormente. Essa expansão territorial traz, dentro em si, a expansão espiritual dos 
umbandistas e a sua confirmação de fé, agora professada pela expansão do território 
ritualístico que, paulatinamente, confere ao movimento uma simbologia de 
pertencimento epifânico e, com isso, reduzindo drasticamente os adeptos que ainda 
resistem à confissão de sua fé. Aureanice Correa redesenha o espaço do sagrado como 
atributo da própria espacialidade geofísica  do humano, na medida em que produz 
sentidos e significados a partir de manifestações culturais específicas. Ou seja,  O 
sagrado, como um dos atributos da espacialidade, se traduz através de práticas 
culturais eivadas de sentido religioso, de crenças, mitos e divindades. (Corrêa, 2008, p. 
163) 
De qualquer forma, passados quarenta anos desde a observação datada de 
Barros e acima citada, a mesma pode e deve ser atualizada, pois o caráter sistêmico da 
ritualística  da fé nos mistérios de Iemanjá  permitiu a  redefinição constante de uma 
educabilidade  ecossociocultural de seus  crescentes  adeptos, assim como de amplos 
setores da sociedade, em que o imaginário místico do território do sagrado amplia-se e 
cerca-se de  notória e  franca  manifestação  de fé, expressa por parte dos umbandistas,
sem o sentimento de um estigma social pronunciado, tal como podia ser constatado e,
no dizer de Barros, em seus fiéis, há quatro décadas passadas.



A escultura de Iemanjá na praia do Cassino como o maior símbolo da fé umbandista
Era preciso dar-lhe o lugar certo, seu, no qual não houvesse arbitrariedade, e 
era preciso inseri-la na calma duração do espaço e nas suas grandes leis. 
Tinha que caber no espaço à sua volta, como num nicho; sua segurança, seu 
equilíbrio e sua elevação não emanariam do seu significado, mas do seu 
ajuste harmonioso ao ambiente. (R.M.Rilke, Monografia sobre Rodin, apud. 
Tucker, 1999).
A vantagem da escultura é que ela não se prende a um ambiente específico, 
como a parede de um museu. A vantagem da escultura é que ela pode ser exposta livre 
das paredes, dos artifícios arquitetônicos, dos padrões estabelecidos pelo 
aprisionamento da arte. A escultura, contudo, vive de sua autonomia na dependência de 
um ambiente que lhe ofereça o devido valor e respeito. É autônoma, por irradiar um 
sentido e significado em si mesma, ainda que esse “si mesmo” traduza uma antecipação 
de caráter epocal, que pode, certamente, transcender  o momento mesmo de sua 
idealização; por representar um determinado valor cultural, místico, mítico ou 
apologético. Sua espacialidade é sintomática, pois  impregna-se e é ao mesmo tempo 
impregnada pelos ardores de seu idealizador; das disputas, por vezes existentes, dos 
propósitos políticos, econômicos, místicos e míticos.  
A escultura de Iemanjá, localizada no desembocamento da Av. Rio Grande, no 
Bairro Cassino, foi esculpida pelo escultor rio-grandino Érico Gobbi.
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A estátua possui 
2,10 metros de altura e pesa duas toneladas. 
Consta que o escultor, observando a euforia da população durante os festejos a
Iemanjá no ano de 1971, teve a idéia de esculpir uma estátua em homenagem àquela 
divindade. No ano seguinte, deu início à realização do seu desejo e, no ano de 1973,
estava concluída a estátua de Iemanjá, a qual ficou em exposição no seu ateliê, fato que 
atraía intensa visitação por parte dos rio-grandinos e também por devotos oriundos de 
diversas cidades do interior, bem como de Porto Alegre, Rio de Janeiro e São Paulo. 
No dia 27 de novembro de 1974, no salão de festas da Associação Atlética do 
Banco do Brasil (AABB), os umbandistas realizaram o concurso “Rainha da Criança”,


( O escultor Érico Gobbi nasceu em 1925 e faleceu em 2009. Em 1948 ajudou Matteo Tonietti a esculpir vários 
monumentos. O “Monumento à Mãe” e outros, como “Os meninos de calça curta, boné e suspensório” e “A Pira 
da Pátria”. Sua estátua mais famosa é Iemanjá, localizada na praia do Cassino. (Wikipedia. Acesso em 
30/09/2011 )

o qual foi organizado por Elza Machado, do Centro Espírita Cruzeiro do Sul. Foi 
coroada rainha Patrícia Bandeira Moreira. 
A escultura de Iemanjá foi adquirida por  35.000  cruzeiros, havendo 
divergências entre os umbandistas e o executivo municipal quanto ao local ideal em que 
a mesma deveria ser colocada. Em entrevista concedida pelo secretário de turismo de 
Rio Grande,  Sr. Renato Albuquerque, este relatou que disse a Wilmar Tavares, 
presidente da União Rio-Grandina de Umbanda Mãe Iemanjá e aos demais membros da 
diretoria, conforme segue:
Eu disse para eles aonde se realiza a maior festa de Iemanjá do Brasil, 
que é na praia do Cassino, onde termina a Avenida Rio Grande, e ela 
vai ficar ali, de braços abertos, recebendo os turistas, os veranistas e os 
religiosos que vão à festa de Iemanjá. 
A festa de Iemanjá faz parte do calendário de eventos do município do Rio 
Grande, através da Lei 5.291, de 07 de janeiro de 1999.  Da festa participam não 
somente os umbandistas, mas as demais religiões de matriz africana, que influenciam 
no modo de ser cultural e social do coletivo popular e do calendário turístico da cidade. 
O sagrado, o profano e a educabilidade ambiental
A palavra “sagrado” é de origem indo-européia,  e significa “separado”, nos 
ensina Umberto Galimberti, em sua obra “Rastros do Sagrado”. É também desse autor 
italiano o relato a seguir sobre o sentido do sagrado e sua relação com o profano.
Referindo-se à sacralidade, Galimberti indica que esta não é uma condição 
espiritual ou moral, mas uma qualidade inerente do que tem relação e contato com 
potências que o homem, não podendo dominar, percebe superiores a si mesmo, e como 
tais atribuíveis a uma dimensão, em seguida denominada “divina”, considerada 
“separada” e “outra” com relação ao mundo humano. O ser humano tende a manter-se 
distante do sagrado, como sempre acontece diante do que se teme e, ao mesmo tempo, é 
por ele atraído, como se pode ser com relação à origem de que um dia nos 
emancipamos. 
Essa relação ambivalente entre o manter-se distante e, ao mesmo tempo nos 
aproximarmos do sagrado, é o que denota a palavra  religião (re-legere). A 
ambivalência é a essência de toda religião. A palavra  re-legere denota a área do 
sagrado, de modo a garantir simultaneamente a separação e o contato, que ficam  
todavia regulados por práticas rituais capazes de evitar, por um lado, a expansão 
descontrolada do sagrado e, por outro, a sua inacessibilidade.



Assim é que, para o contato com o mundo sagrado, são designadas  pessoas
consagradas e separadas dos demais integrantes da comunidade (os sacerdotes), espaços 
destacados de outros por serem imbuídos de poder (nascentes, árvores, montes e depois 
templos e igrejas), tempos diferentes dos outros e chamados festivos, que distinguem os 
períodos “sagrados” dos “profanos”, em que, fora do templo (fanum), desenvolve-se a 
vida diária marcada pelo trabalho e pelas proibições (os tabus), as quais dão origem às 
normas e às transgressões. 
A oposição sagrado-profano remete à oposição puro-impuro, que circunscreve 
a esfera do mal, criando esquemas de ordem apoiados sobre a antítese de um polo 
positivo e um polo negativo. Com a impureza relaciona-se o contágio, acompanhado 
pela consequente reação de terror e por processos de isolamento, dos quais se sai com 
determinadas práticas rituais, mágicas e sacrificiais. Rito, magia e sacrifício servem 
para manter afastados os efeitos maléficos das potências superiores que habitam a 
esfera do sagrado e para propiciar efeitos benéficos. 
A escultura de Iemanjá é uma representação do estado tensional entre o 
sagrado (o que se encontra separado) e o profano (o que está fora do templo)  a  que, 
através das oferendas, rituais,  cânticos de louvores emprestam uma experiência 
religiosa, isto é, de religação (re-ligare), o que garante o permanente tensionamento 
entre o que dista e o que está próximo, mantendo a aura transcendental dos fenômenos 
sócio-históricos-ambientais.  “Eis porque o ser histórico entende conflituosamente, no 
embate matéria/idéia, que os orixás são seus “mortos/vivos” na significação da natureza 
social (...)” (LIMA, 2008,p. 227). 
A concepção de uma educabilidade ambiental presente na festa de Iemanjá não 
é um fenômeno isolado  e estranho  à fé dos umbandistas, mas a expressão de uma 
prática mística inerente à cosmovisão do sagrado em território profano que, ungido pelo 
cerimonial religioso (a ritualística, as oferendas, os cânticos e assim por diante), 
reinstala o divino no ambiente mesmo de seu universo mítico, numa espécie de 
sagração da natureza, ou mesmo no ambiente  urbano,  antes tido como ambiente 
profano. É que a natureza é o lugar por excelência da manifestação do sagrado desde os 
tempos imemoriais da humanidade, cuja representação é mediada pelos sacerdotes, pais 
de santos ou  xamãs.  Assim que, se por um lado pode-se presumir que o ambiente 
natural é o palco de toda e qualquer instância significativa do educar, do conhecer e do 
saber humanos, por outro lado a transgressão artificial do ambiente natural,
notadamente a partir das  centralidades urbanas e seu aparato tecnocientífico, tende a 
operar no sentido inverso à realização da participação do divino na ambiência particular 
do sujeito ou do objeto da veneração em campo aberto. Eis que a educabilidade 
ambiental, nesse sentido, é uma práxis de reordenamento do olhar do fiel umbandista 
para o universo místico reapropriado pelo espaço físico através da procissão, do 
encontro com as águas e dos rituais em meio à natureza, à  physis. A transposição do 
espaço restrito do sagrado (congá), da casa de oração para um território  tido como 
profano, é a experiência mesma do educere (ex-ducere), do conduzir algo ou alguém do 
espaço restrito em que se encontra. O prefixo “ex” de ex-ducere, tem a mesma raiz da 
palavra expor, isto é, “pôr para fora”, sair do lugar em que se está. Educere portanto é o 
educar o outro a partir de uma práxis de deslocamento do estado em que está para outro, 
conforme o desejo e a vontade da comunidade (comum-unidade) que encerra em si 
mesma o anseio da formação ética e moral dos seus constituintes. O sagrado expande-se 
e, ao expandir-se, sacraliza o espaço que ocupa. 
A escultura de Iemanjá guarda dentro em si a representação dos poderes 
místicos da natureza confiados à espécie humana e aos seus sacerdotes como 
mediadores.  Os objetos de adorno, oferendas e cânticos, como já assinalamos, 
emprestam aos seus mistérios a fecundidade de uma natureza redefinida em forma de 
sentimento de pertença, de irmandade, de cumplicidade à unidade; do múltiplo e do 
uno; do fecundo sentimento de vida e morte  no imaginário pórtico da eternidade 
representada pelo poder oculto do sagrado e pela mística do objeto de sua adoração. 
As efemérides em homenagem a Iemanjá, o seu élan profundamente religioso 
vivenciado  por seus fiéis, oportuniza o  resgate da unidade transcendental dos 
fenômenos da vida do espírito com o anelo imanente e universal ao humano, que é o seu 
contínuo processo de formação ética, moral e civilizatória,  cujas raízes são irrigadas 
pela natureza e  cuja mística e ritualística constituem-se em um portal de acesso ao
divino, onde se dilui a separação  racional  entre natureza e cultura e sobreleva-se o 
reencantamento do mundo pela reapropriação do êxtase emanado pela expansão do 
sagrado, ou seja, do  sentimento de unidade do real na diversidade de suas 
manifestações, o qual permeia o existir humano e não humano dotando-o de sentidos e 
significados.

Festa de Iemanjá na Praia do Cassino Rio Grande


2 de fevereiro, comemora-se em todo o Brasil o Dia de Iemanjá, a Rainha do Mar. Em Rio Grande,a festa em sua homenagem entra pela noite adentro e reúne milhares de pessoas que deixam suas oferendas junto ao seu monumento na Praia do Cassino.
Iemanjá, a mãe poderosa
Trazida ao Brasil pelos povos de origem ioruba, desde que assumiu o reino das águas salgadas começou a ser cultuada pelos pescadores como sua padroeira. Ao mesmo tempo, quanto mais o seu papel de mãe se fortaleceu, maior foi a aproximação com a mãe dos católicos, Nossa Senhora, com a qual é sincretizada.
Iemanjá está associada aos rios e suas desembocaduras, à fertilidade das mulheres, à maternidade e principalmente ao processo de criação do mundo e da continuidade da vida. Seu culto original a associa ao plantio e colheita dos inhames e coleta dos peixes, donde seu nome Yemojá (Yeye Omo Ejá), Mãe dos filhos peixes, divindade regente da pesca.



No Brasil, conforme historiadores, o culto as divindades-mães teria chegado aqui por intermédio de Iemanjá. Outros orixás-mães são aqui cultuados com ela, como: Oxum e Nanã Burucu. Iemanjá, Oxum e Nanã aqui tiveram uma profunda inter-relação mítica com as sereias do paganismo europeu, com as diferentes denominações de Nossa Senhora e com as iaras ameríndias, as mães-d’água, chamada de Iara. O culto hidrolátrico das divindades africanas em solo brasileiro prescindiu de modificações substanciais já que, distanciando da terra-mãe, perderia seu significado caso não encontrasse um terreno favorável à sua constituição.
O culto de Iemanjá realizado à beira do rio Ogum em Abeocutá na África, transferiu-se no Brasil para o mar. No continente de origem, o mar era o reino mítico de Olocum, literalmente o Dono ou a Dona do Mar, divindade considerada pai ou mãe de Iemanjá. Os orixás que na África estavam associados a um acidente geográfico específico, especialmente aos rios, perderam no Brasil tal associação e tiveram o culto generalizado, Iemanjá perdeu o rio Ogum e ganhou o mar. A nova geografia reorganizou o panteão; a nova cultura rearranjou os patronatos.



Quanto mais o papel de Iemanjá como mãe se fortaleceu, mais foi se aproximando da mãe dos católicos, Nossa Senhora, com a qual é sincretizada nas diversas regiões do Brasil. Tanto é assim que suas festas mais importantes são comemoradas de acordo com o calendário católico. O culto sincrético de Iemanjá ocorre principalmente em datas festivas das Nossas Senhoras católicas mais populares em cada região, aquelas que têm nas diversas cidades o maior número de devotos, como Nossa Senhora das Candeias em Salvador, Nossa Senhora do Carmo em Recife, Nossa Senhora da Conceição em São Paulo.
Outras formas de contato com a Rainha do Mar, a julgar pela crescente presença da população nas festas celebradas nas praias brasileiras – se não for fé, pelo menos pela emoção da participação coletiva – tornam possível declarar Iemanjá como o orixá mais popular do Brasil, visto pelo povo do candomblé, pelo povo da umbanda ou ainda pela sociedade como um todo.